Saiba porque as pseudoterapias não funcionam

É provável que você tenha tido a experiência, ou conheça alguém, que já tenha se submetido à alguma pseudoterapia. E tenha percebido algum tipo de resultado. Hoje, com acesso facilitado às informações através da internet e das redes sociais, surgem ainda mais oportunidades e receitas incríveis para resolver nossos problemas emocionais, psicológicos e de relacionamento.

Para pensarmos nisso, precisamos refletir um pouco sobre a popularização do conhecimento psicológico.  Cada vez mais pessoas tem acesso a temas da psicologia e desenvolvimento humano  – o que é muito bom!. Porém, o que se observa junto disso é o fenômeno da Mercantilização do Conhecimento Psicológico:

Vale tudo, se você vende.

As técnicas de marketing são vendidas como algo a ser aplicado de forma indiscriminada em qualquer área do conhecimento, sem a devida reflexão ética. A partir disso, passou a ser vendido tudo aquilo que parece, mesmo que remotamente, com psicologia.

A psicologia se torna um produto da “moda”. São apresentados seus benefícios, são utilizados gatilhos de marketing para conectar com as pessoas (urgência, escassez, prova social, história) e tem início um mercado muito promissor. Surfando neste movimento, surgem procedimentos e marcas protegidas por copyright (por exemplo: Constelações Familiares, PNL, ThetaHealing).

É um compêndio de coisas bem conhecidas da psicologia. Mas não é psicologia.

Pseudoterapia é definido por Sierra (2019) como “A substância, produto, atividade ou serviço com suposto propósito de saúde que não é apoiado por conhecimento científico ou evidências científicas que suportam sua eficácia e segurança”. As intervenções que não possuem sustentação no método científico, não possuem garantia de segurança. E isso é muito sério!

 “Toda ajuda é válida, mal não vai fazer!

Talvez você já ouviu essa frase, mas não é bem por aí. As pseudoterapias são arriscadas. Elas podem afetar negativamente a saúde, são utilizadas como substitutiva de tratamentos convencionais e podem interferir de forma negativa em tratamentos que estão em curso.

Em muitos casos, não há comprovação do benefício. A pseudoterapia pode ser comprovadamente uma fraude, ou até contribuir para o bem-estar, mas o processo de tratamento é desconhecido. Existem também terapias que são seguras e eficazes para algumas indicações, mas não são para outras (Ex: Antibiótico para doença viral; hidroxicloroquina para COVID-19).

Principais diferenças entre pseudoterapias e as verdadeiras psicoterapias

Para Cuevas (2016), as pseudoterapias:

  • Não tem evidências científicas suficientes
  • Não partem de teorias ou abordagens comprovadas
  • São apresentadas com aparência atraente
  • Se vendem como eficazes e contrastantes
  • Não possuem proposta efetiva
  • Não tem avaliação de risco
  • São aplicadas técnicas, sem critério
  • Falta clareza nos objetivos
  • Utilizam técnicas manipulativas
  • Tem possibilidade de gerar dependência

As pseudoterapias carregam com um discurso de cientificismo, onde o “terapeuta” é uma figura de muito carisma, amável ao tratar os pacientes como um amigo de longa data. Por trás disso, existe uma exploração da fragilidade e da vulnerabilidade de quem busca ajuda para aliviar seu sofrimento (Moriana, & Galvez-Lara, 2020).

Por que algumas pessoas se sentem bem?

Mesmo com tudo isso, muitas pessoas relatam graus de satisfação, percebem melhora nos sintomas, bem-estar ou qualidade de vida. O que acontece? É efeito do tratamento? Efeito placebo?

Não temos estudos que nos permitam determinar a que se deve o efeito dessa melhora. Por estarem embasadas em pseudociência, se torna praticamente impossível entender isso. As pesquisas de processo em psicoterapia podem nos ajudar a compreender.

O que é Pesquisa de Processo em Psicoterapia?

Pesquisa de Processo em Psicoterapia é uma área de estudo que tem como objetivo compreender o que acontece ao longo de um tratamento psicológico, para entender o que contribui para a melhora do paciente:

  • As técnicas utilizadas?
  • A forma que o profissional se posiciona?
  • A relação terapêutica?
  • Fatores pessoais e subetivos do paciente?

Indicadores de Mudança na Psicoterapia

Dentre as muitas coisas que são avaliadas quando estudamos o processo em psicoterapia, podem ser observados os indicadores de mudança, que são “fases” que existem ao longo do percurso. É uma sequência de mudanças que acontecem à medida que for ocorrendo progresso no tratamento. Os indicadores de mudança são estruturados em três etapas (Krause et. al, 2006):

  • Consolidação Inicial da Ajuda
  • Aumento da permeabilidade em direção a novos conceitos
  • Construção e consolidação de novos entendimentos

O que podemos observar é que a oferta de pseudoterapias é uma consolidação inicial de ajuda, onde a pessoa aceita a existência de um problema e seus próprios limites, e reconhece o profissional como alguém capaz de ajudar. Alguém, ao buscar ajuda, expressa esperança, começa a questionar sua forma de entender e perceber o mundo, expressa necessidade de alguma mudança e pode até chegar a reconhecer a sua própria participação nos problemas.

Acontece que isso tudo está apenas na primeira etapa do processo de mudança. As pseudoterapias não tem estrutura sólida, referencial teórico consistente nem segurança para sustentar a continuidade de um processo de mudança.

Nesse momento, muitas pessoas são iludidas.

Elas experimentam o início de uma mudança, mas não é possível seguir adiante. Faltam as ferramentas necessárias, para o profissional e para a pseudoterapia. É como se abríssemos todas as gavetas de uma cômoda, tirássemos tudo para fora e sentíssemos a (falsa) sensação de que estamos fazendo uma organização.

Mas tirar tudo para fora sem ao menos saber o que fazer com isso, gera um problema maior do que tínhamos antes.

Relatos de experiência e ações de marketing fazem parecer que pseudoterapias psicológicas funcionam. Elas apenas mascaram problemas. Podem causar danos e são perigosas. Não confie a sua saúde àquilo que não possui evidência de segurança.

Pseudoterapias não funcionam, e podem te fazer mal.

Em caso de sofrimento psicológico, emocional, dificuldades no relacionamento ou busca de desenvolvimento pessoal: procure um profissional da psicologia.


Referências:

Cuevas (2016). Evaluacion de persuasión coercitiva en contextos grupales (Tesis Doctoral). Málaga: Universidad de Málaga.

Krause, M., de la Parra, G., Arístegui, R., Dagnino, P., Tomicic, A., Valdés, N., … Ramirez, I. (2006). Indicadores genéricos de cambio en el proceso psicoterapéutico. Revista Latinoamericana de Psicologia, 38(2), 299-325.

Moriana, J. A.; Galvez-Lara, M. (2020). Psicoterapias y pseudoterapias en búsqueda de la evidencia científica. La ciencia y la práctica   profesional en psicología clínica. Papelesdel Psicólogo / PsychologistPapers, in press.

Sierra, M. C. (2019). De qué hablamos cuando hablamos de pseudoterapias. Plan para la Protección de la Salud frente a las   Pseudoterapias. Revista Clínica Contemporánea(2019), 10, e7, 1-5

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